terça-feira, 21 de setembro de 2010

Gestão de Talentos em Foco

Treinamentos de baixo impacto: por quê? Quero fazer inicialmente um breve exercício. Pense nos últimos treinamentos pelos quais você passou. Não importa o canal nem a metodologia: ensino à distância, encontro presencial, palestra... Pense nesses momentos em que você estava na posição de “aprendiz“, recebendo um conteúdo preparado para você “aprender“, e responda: Qual era o objetivo principal desse treinamento? Quais as mensagens secundárias de grande relevância que ele trazia? O que mudou em você ou em sua vida profissional depois de passar por esse treinamento?

Se, por acaso, você não soube responder com precisão a alguma dessas perguntas, esse é o momento de ficar preocupado. Isso significa que os treinamentos não têm tido eficácia mínima (ou seja, conteúdos não foram aplicados e nem mesmo retidos pelos participantes). Logicamente, depois de um evento de treinamento podemos esquecer detalhes e dicas recebidos, ou mesmo confundir alguns conteúdos que não pertencem ao nosso dia a dia e que estão mais distantes das nossas realidades. Mas esquecer grandes objetivos e mensagens dos treinamentos pelos quais passamos nos diz claramente que esses treinamentos pouco ou nada serviram em nossa vida.

Faz sentido? Nem um pouco! Foram investidos em treinamento de pessoas mais de R$ 1.600 per capita no Brasil em 2009, segundo dados da ABTD; e, mesmo sem medidores de eficácia confiáveis, acredita-se que muito desse dinheiro escorreu ralo abaixo. Mas, antes de ficarmos revoltados com investimentos em treinamentos pouco produtivos ou nos autoflagelarmos por não aproveitar ao máximo esses momentos de desenvolvimento, vale a pena analisar criticamente o porquê do baixo impacto desses treinamentos.

Muitas causas podem ser diagnosticadas e gostaria aqui de iniciar uma transcrição delas, dividindo-as em blocos de interesse.

1. Conteúdos:

* Distantes da realidade dos participantes: é uma causas mais comuns do baixo impacto de treinamentos. Referem-se a conteúdos muito conceituais ou pouco práticos, em que os participantes não conseguem tangibilizar um conhecimento ou uma mudança comportamental, por exemplo. Os participantes saem com a sensação de que houve muita teoria e não conseguem entender como fazer diferente determinado trabalho mesmo depois do treinamento.

* Construídos a partir de briefings errados: problemas com relação a conteúdos podem ser originados de diagnósticos mal executados, em que o entendimento do cenário e desafios reais dos participantes não são bem estudados. São aqueles famosos treinamentos em que saímos com a sensação de que o conteúdo foi comprado de um fornecedor que não entende nada do negócio da empresa.

* Ultrapassados ou sem atualização: alguns conteúdos sobrevivem durante anos nas empresas, com os mesmos slides, mensagens e insights, repetidos por inúmeras vezes aos mesmos públicos. São materiais que, por mais bem construídos que sejam, perdem o valor por serem antigos e/ou repetitivos. Nesses casos, os participantes costumam saber de cor a ordem dos slides e as respostas dos exercícios, fazendo com que o treinamento se torne cada vez menos interessante.

2. Público:

* Heterogêneo demais: é comum encontrar em sala profissionais com atividades e/ou conhecimentos muito distintos e que, por causa disso, interpretam e valorizam o treinamento de forma também muito distinta. Nesses casos, formam-se grupos de mais ou menos interesse pelo conteúdo do treinamento, provocando dispersão e dificuldades na condução de atividades programadas.

* Homogêneo demais: muitas vezes o treinamento possui participantes muito parecidos e que não trazem à tona visões ou pontos de vista diferentes para discussões. Esse público costuma não ser muito ativo em treinamentos, recebendo passivamente a informação e não gerando polêmicas “saudáveis” na construção de conceitos em sala.

* Desinformado: nesses casos, o participante chega à sala de aula sem saber qual é o treinamento que vai realizar. Essa é uma grande dificuldade a ser superada na geração de expectativas e na preparação individual para receber conteúdos.

* Ausente: o participante nem foi ao treinamento porque não sabia da sua existência ou, pior, sabia e optou por não ir. Essa dificuldade muitas vezes é gerada pela falta de incentivo do próprio líder do participante, que pode não valorizar o treinamento ou mesmo não saber de seu impacto para o desenvolvimento do seu colaborador.

3. Instrutor:

* Mal informado: o responsável pelo treinamento (consultor, instrutor interno ou externo, multiplicador, tutor) não foi devidamente contextualizado sobre a empresa, o treinamento e o público, e passa a repetir em sala conteúdos não customizados à realidade daqueles presentes. Esse é um grande problema para empresas que trabalham com modelos de treinamento em massa, com muitos instrutores atuando ao mesmo tempo com uma grande quantidade de treinamentos, em que a qualidade da transmissão de conteúdos dificilmente é medida.

* Despreparado: o responsável pelo treinamento não possui todas as ferramentas (conhecimentos, técnicas, métodos) para a condução de um bom evento. O instrutor pode não saber que essas ferramentas existem ou pode ter se preparado mal, mesmo com todas as ferramentas em mãos.

4. Estrutura de treinamento:

* Com métodos errados: a sinergia entre o perfil do público e a forma como o conteúdo é exposto é fundamental para o sucesso de um treinamento. O mesmo conteúdo pode ser exposto de forma conceitual e prática, objetiva e lúdica, superficial ou profunda, dependendo do público a quem ele vai ser apresentado. Fazer um treinamento para gerentes sobre venda consultiva é diferente do que fazer o mesmo treinamento para os vendedores – exercícios, linguagem, dinâmicas e foco do treinamento devem ser adaptados a cada público.

* Com lógica errada: a forma como os conceitos são apresentados define como as mensagens e conteúdos são aprendidos pelos participantes. Nesse contexto, a conexão entre os temas explorados no treinamento deve fazer sentido para os participantes, tal como em uma história que possui começo, meio e fim. Treinamentos que não oferecem essa lógica estão mal estruturados e dificultam a compreensão por parte dos participantes.

* Com baixa troca de conhecimentos entre os participantes: segundo os novos conceitos de socialização de aprendizagem, os treinamentos devem estimular a troca de informações entre todos aqueles que participam do treinamento, em uma constante construção conjunta de conteúdos que difere da antiga relação professor-aluno.

5. Infraestrutura:

* Com elementos externos que prejudicam a aprendizagem: parece pouco, mas não é. Calor ou frio demasiados; fome e sede; cadeiras desconfortáveis; e dificuldades de leitura e audição são elementos por vezes pouco percebidos como ruídos em treinamento. E, quando percebidos, são às vezes negligenciados. O participante adulto, para estar em uma posição de “aprendiz“, requer a existência de sensações físicas satisfatórias que permitem a ele uma postura receptiva ao treinamento.

Essas foram apenas algumas explicações para treinamentos mal sucedidos, com baixa retenção de conteúdos e eficácia geral. Com certeza, há outros motivos que transformam treinamentos em ações de baixo impacto e que podem ser adicionados nesses e em outros blocos de interesse. Meu convite a todos que se interessam por esse assunto agora se divide em dois:

1) Ampliar essa lista de motivos para treinamentos de baixo impacto, com entendimento cada vez mais profundo dos motivos pelos quais os eventos de treinamento possuem baixa eficácia.

2) Construir uma lista de orientações gerais para treinamentos de alta eficácia, em contrapartida à lista anterior.

Vamos lá?


Daniel Maganha (daniel@gsmd.com.br), Gerente de Desenvolvimento T&D da GS&MD - 21/09/2010

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