segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A reinvenção da loja

A loja deixou de ser apenas um ponto de venda (PDV) para incorporar inúmeros outros papéis no cenário multicanal. Ao sair do espaço físico tradicional ocupado nos shoppings e nas ruas para se virtualizar na internet, nos celulares, na televisão, no cinema ou mesmo em outros destinos, a loja tradicional assume outras funções para continuar sendo destino e oferecer muito mais que produtos e serviços aos consumidores.

Um exemplo marcante é o que a Tesco criou na Coréia do Sul, onde implantou numa estação de metrô uma loja virtual onde os consumidores podem ler com seus celulares os códigos QR dos produtos que estão expostos, obter mais informações, comparar preços e, se interessados, comprar os produtos, que são posteriormente entregues em casa ou no escritório.

Mas esse é apenas um exemplo, talvez mais atual e extremo, das opções que se criaram para que os consumidores comprem onde, quando e como quiserem num cenário no qual a hiperconveniência tornou-se fator crítico e o mais relevante no processo de decisão de onde comprar, como foi mostrado na pesquisa apresentada pela GS&MD – Gouvêa de Souza durante o 14º Fórum de Varejo da América Latina, realizado em São Paulo nos dias 20 e 21 de setembro.

Consumidores modernos, nos mercados mais maduros, têm muito mais alternativas, acesso, informação, variedade, preços, serviços, atendimento e orientação para ajudá-los a comprar. Só não têm mais tempo e, por conta disso, se tornam crescentemente demandantes de mais conveniência para ajudá-los em suas compras. E foi essa demanda que liderou a resposta direta dada por clientes que deixavam lojas de departamentos, eletrodomésticos, farmácias e supermercados no estudo apresentado. Mais do que preço e variedade, a conveniência foi o fator decisivo da escolha, entendida como a facilidade de acesso; a proximidade física; e a possibilidade de entrar, comprar e sair rapidamente.

Esse comportamento é mais presente e determinante em grandes metrópoles de mercados consumidores também maduros, em que o tempo se torna um fator cada vez mais crítico, o que explica por que grandes formatos, como supercenters e hipermercados, têm enfrentado crescentes dificuldades para se reinventarem. Muitos deles se tornaram inconvenientes.

Em mercados emergentes, em especial em países e regiões onde a expansão do consumo é mais recente, como Índia, China, África do Sul ou mesmo regiões brasileiras recém-incorporadas à nova geografia do consumo, a situação é diversa: variedade, promoções e percepção de preços mais baixos são fatores que crescem de importância, e basta uma visita a superlotadas grandes lojas em Mumbai, Xangai ou no Centro-Oeste, Norte ou Nordeste do Brasil para termos a constatação desse fato.

Mas independente de onde se encontre a loja, o PDV tem se reinventado para oferecer mais e competir com alternativas mais convenientes, em especial todas aquelas que são digitais. E assim será à medida que as novas gerações, em especial a Y e a Z, aumentem sua participação no cenário de consumo, incorporando um comportamento multicanal, multitarefa e multifacetado na sua relação com produtos, marcas e serviços.

Mais do que um PDV, a loja se transforma num Ponto de Experiência (PDE), proporcionando emoções e sentimentos que se incorporam aos produtos e serviços, como na Stew Leonard’s ou na Build-A-Bear Workshop. Se transforma também em Ponto de Integração (PDI), quando é o local no qual desenvolvimento, produção, distribuição e comercialização convergem sob controle único, como ocorre com as lojas da Zara, Nike ou Nespresso, ou no Brasil com a Riachuelo.

As lojas também se transformam em Ponto de Aprendizagem (PDA), passando a ser locais onde os consumidores vão comprar, ou receber, ensinamentos sobre produtos, como fazem os supermercados Dominicks nos Estados Unidos, oferecendo cursos pagos sobre vinhos, alimentação saudável e outros; ou como faz a REI, também por lá, oferecendo aulas pagas de práticas esportivas, como montanhismo, escalada e ciclismo, algumas ministradas por seus próprios funcionários.

Igualmente podem se transformar em Pontos de Serviços (PDS), um dos aspectos mais discutidos no evento, ao oferecerem toda uma gama possível de serviços aos clientes, independentes ou integrados aos produtos, aumentando o valor percebido e permitindo maior rentabilidade. Em especial os serviços financeiros e os de conveniência. Hoje estamos no início de um ciclo que vai transformar o varejo. Em vez de vender o purificador de água, oferecer a água pura. Em vez da tinta para pintar, o imóvel pintado com a garantia do varejista. E nesse jogo aumenta o espaço para a ação direta de marcas e fornecedores, oferecendo a solução completa para o consumidor, como a Unilever já ensaia com sua operação piloto no Brasil com os purificadores de água, em ação totalmente diversa de sua tradicional estratégia de atuação.

Com as mudanças de hábitos as lojas também se transformam em Pontos de Consumo (PDC), em especial de alimentos, por conta do crescimento da participação da alimentação fora do lar, fazendo com que muitos super e hipermercados incorporem áreas destinadas ao consumo no próprio local, como o recente projeto Planet do Carrefour, que agora se expande na Europa. Mas não só: o Monoprix na França redesenhou suas lojas a ponto de criar um módulo compacto (Monop) em que a alimentação na própria loja ocupa um espaço ainda maior.

Os exemplos se sucedem, mas todos eles convergem para uma mesma realidade: a loja não é e nunca mais será a mesma concepção pura do passado. Ela avançará cada vez mais como catalisadora de outras oportunidades, demandas e necessidades, como ação para ocupar novos papéis ou como reação ao crescimento do varejo digital.


Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br), diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza 26/09/2011

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